quarta-feira, 23 de junho de 2010

MAGNETISMO

Desde que se entendiam por gente, conheciam um ao outro. Perdiam-se na linha do tempo que definia o início da amizade. Nessa perdição, desentendiam-se sempre que tocavam no assunto. Ele a considerava amiga desde os primórdios; ela o tinha por amigo desde antes - bem antes - do período que por ele era entendido como "primórdios".

Levavam a vida assim, nessa eterna dependência mútua. Conviviam o mais próximo possível e dessa prazerosa interação começaram a surgir as canções. Cada qual com seu violão rasgando madrugadas afora.

Como se não bastasse, estava selada mais uma ligação entre os dois: a música.

O reconhecimento não tardou. Começaram cantando - sempre juntos - para amigos, e esses amigos gostavam tanto do que ouviam que por sua vez propagavam para mais amigos que espalhavam para outros e outros a outros.

Vieram contratos, entrevistas, maquinários, muitas canções, estúdios, participações, viagens, consertos...

Certa vez, quando comemorando o sucesso de mais uma apresentação, por entre as roupas de mais um camarim, cara-a-cara - como era de costume, não puderam resistir a um beijo. Ardente como que esperado há anos por ambos os lados.

Afastaram-se rapidamente. "Caídos em si", cada qual se encostou à parede mais oposta. Mal podiam crer que teriam posto fim a uma conexão tão profunda. Estragaram a amizade, a carreira, tudo. Culpavam a si mesmos e, ao mesmo tempo, recriminavam ao outro - que não foi capaz de manter-se nos eixos e evitar tamanha desgraça. Precisavam pensar em alguma solução, algum intermédio, algum remédio.

Antes, porém, como que atraídos como ímãs pela boca e corpo do outro, despregaram-se dos pólos opostos e uniram-se novamente. Afinal, tudo já estava consumado, mesmo. Agora mais do que nunca, pensariam na finalização do problema juntos.

... com uma boca na outra.